Conferência na Índia discutiu aspectos da cultura Natha, que deu origem ao Hatha Yoga.

Ao final de fevereiro de 2009 aconteceu na cidade de Bangalore, na Índia, um encontro que reuniu representantes da cultura Natha, a tradicional seita shaivista da qual surgiu o Hatha Yoga – a forma mais difundida de yoga no mundo ocidental. Proposto para ser um seminário, o evento ganhou proporções de congresso, em razão da qualidade e profundidade das contribuições levadas pelos diversos participantes, tanto na mesa diretora quanto na platéia presente.

A “Conferência sobre a Tradição do Natha Yoga Sampradaya”, que é o nome pelo qual os organizadores designaram o encontro, foi produzida pelo International Yoga Coordination Center – Yococen. Criado em 1976, na Índia, (por iniciativa da brasileira Maria Helena de Bastos Freire) com a finalidade de se tornar um centro de referência para a documentação séria do sistema do yoga, o Yococen, hoje se alinha com a força tarefa do governo da Índia que se empenha na tradução e disponibilização pública de textos sânscritos sobre a sabedoria tradicional, para evitar que oportunistas se sirvam dessas informações em benefício próprio – como, por exemplo, o registro de patentes sobre informações que fazem parte da herança cultural da cultura hindu.

A conferência se desenvolveu ao longo de quatro dias, entre 26 de fevereiro e 1º de março, e os trabalhos foram abertos com a presença de dois importantes líderes do shaivismo do Estado de Karnataka, Dr. Shree Shree Shantaveera Mahaswamiji e Shree Shree Shree Balagangadharanatha Swamiji.

Todos os dias os trabalhos se iniciavam com uma aula prática de asanas coordenada por Niranjana Murthy, de conformidade com um programa definido pela Vivekananda Yoga Research Foundation de Bangalore. Depois, ao longo do dia, os conferencistas apresentavam suas palestras e demonstrações versando sobre aspectos variados da tradição do yoga.

Quanto ao conteúdo da conferência, destacamos as apresentações de Sri Bhola Nath Yogi, do Nepal, que tratou da sabedoria do yoga vista pela perspectiva dos nove nathas e dos 84 siddhas; o médico Dr. Joshi, de Haridwar, que tratou da aplicação dos pontos marma na prática do yoga; o Guruji M.S.Vishwanatha, de Bangalore, que esclareceu alguns pontos obscuros sobre a doutrina das mudras; o professor de Sânscrito Mr. R.K.Narayanan, que fez uma apresentação elucidativa sobre o texto sânscrito Matsyendranath Samhita, do qual ele está fazendo a tradução, por solicitação do Yococen; e a esclarecedora palestra de Swami Shivanathjee Maharaj (foto abaixo), um monge natha de Orissa, que traçou uma histórico do movimento Natha e um resumo de sua grande importância na própria história da Índia. Também foi muito interessante a apresentação de Swami Brahmacharyaji, monge natha de Kathmandu, Nepal, que apresentou sua tradição como a porta de ingresso ao gotra (família espiritual) de Niranjana (Shiva) e à casta dos yogis (ou seja, dos que renunciaram ao sistema de castas).

Essa conferência sobre os Nathas procurou deixar claro que essa tradição não foi, para a Índia, apenas mais uma seita, com visões peculiares sobre detalhes do Hinduísmo, mas foi um sinônimo de Dharma, ou seja, uma forma completa de conhecimento e cultura. Essa releitura do Hinduísmo dava a ele uma grandiosidade ecumênica como jamais alcançou depois dos Nathas. O movimento Natha foi aceito como norma e orientação por hindus, muçulmanos, budistas, homens e mulheres, pobres e ricos, sem qualquer distinção de origem, casta ou posição social. O yogi é um indivíduo reconectado consigo mesmo, com sua família e com a sociedade, de uma forma diferenciada, em que sua dignidade é a mesma de um príncipe nas cortes mundanas.

Na visão natha, o próprio universo pode ser extinto, mas o yoga jamais deixará de existir. O yoga natha é aquele que traz à superfície a perfeição que está dentro de cada um de nós, e nos torna tão importantes quanto o próprio poder criador do universo. Por essa razão nenhum yogi se curva diante de nenhum deus quando entra num templo, e para trazer esse deus à sua presença, ele utiliza um pequeno apito, que representa o pranava, a verdadeira voz do criador que ressoa em nossos corações.

Para encerrar esse relato, chamo a atenção dos praticantes de yoga para que reflitam, quando se entregarem às suas posturas e pranayamas, sobre o significado que essas mesmas práticas tiveram para os seus criadores, os grandes mestres nathas. Nenhum deles estava preocupado com a saúde corporal, beleza ou posição social, mas apenas buscavam meios de encontrar e manifestar a perfeição inata, que se manifesta como a semente de nossa personalidade mortal. Alcançar essa perfeição, para um natha, é o mesmo que alcançar a imortalidade.