Nesta entrevista, o atual editor dos Cadernos de Yoga fala ao Yogaforum sobre esse periódico que em pouco tempo se tornou referência para instrutores e praticantes. Ele fala sobre a breve história do periódico, os planos para o futuro e traça um perfil da primeira publicação brasileira séria sobre o tema “yoga”.

Yogaforum: Quem criou o projeto “Cadernos de Yoga”, e em que circunstâncias?

Nunes: Os Cadernos de Yoga começaram como um projeto coletivo de Karma Yoga. Nasceu ligado ao Instituto Dharma – Yogashala que, na época, era uma ONG sem fins lucrativos. Transcrevo trecho da proposta do Instituto, como consta na primeira edição dos Cadernos de Yoga:

“O Instituto tem por objetivo promover o desenvolvimento de atividades sociais visando a divulgação da filosofia do Yoga e do Karma Yoga (Yoga da ação social) como instrumento de transformação do indivíduo e da sociedade. Entende-se por Karma Yoga a ação praticada para elevação da consciência que se desenvolve através da realização de projetos sociais sustentáveis, trabalho, produção, estudos, pesquisas, aulas extensivas, seminários e cursos intensivos, preparação e divulgação de estudos e relatórios, edições e publicações”.

Os Cadernos são, portanto, fruto dessa visão. E nasceu a partir da iniciativa e participação de Markus J. Weininger, Pedro Kupfer, Noêmia Guimarães Soares, Camila Reitz, Madu Madureira, Rodrigo Gomes Ferreira. Na época faltavam publicações especializadas em Yoga. A idéia foi criar uma publicação pioneira em seu formato, que trouxesse artigos mais profundos que uma revista, num formato menor do que um livro.

Yogaforum: Os Cadernos de Yoga estão vinculados a alguma instituição ou movimento?

Nunes: Os Cadernos de Yoga são uma publicação independente. Se estamos ligados a algum movimento, este é o da liberdade do Yoga e no Yoga.

Yogaforum: Como você descreveria a política editorial dos Cadernos de Yoga? Em algum lugar vocês falam em “Satsang impresso”… o que seria isso?

Nunes: Os Cadernos de Yoga, desde o seu nascimento, são um espaço aberto para divulgação do conhecimento yogi. Digo aberto porque qualquer pessoa tem a oportunidade de publicar nos Cadernos, desde que não sejam artigos dogmáticos ou preconceituosos. Recebemos textos de praticantes e professores de todo o país, fazemos uma seleção, se necessário consultamos o conselho editorial, e publicamos. Em troca, esses colaboradores recebem edições dos Cadernos. Nenhum dos nossos colaboradores recebe dinheiro por ter escrito. Os participantes sabem da importância de divulgar o conhecimento e compartilhar o aprendizado. Acredito que a expressão “satsang impresso” remete a essa idéia de participação e esclarecimento coletivos.

É importante frisar que recentemente os Cadernos passaram por uma mudança em sua administração e no corpo editorial. A partir da edição 19, como parte dessa mudança, temos uma nova linha de ação. Estamos nos reaproximando mais dos conselho editorial, pois algumas pessoas dali haviam se afastado, e convidamos novos membros ao conselho. Criamos algumas seções fixas a partir de assuntos que escolhemos e convidamos a escrever estudiosos especialistas nessas áreas. Entre esses assuntos estão os seguintes: mantras, ásanas, ativismo yogi, culinária indiana, simbolismo védico.

Antes, tínhamos duas ou três seções fixas e trabalhávamos com artigos traduzidos do Frawley, Feuerstein e Kak, gentilmente cedidos pelos autores, e com artigos enviados de praticantes, professores, alunos. Fazíamos uma seleção e, pronto, nascia mais uma edição dos Cadernos. Com a mudança, continauremos tendo a participação da comunidade yogi, mas teremos mais seções fixas. Manteremos, porém, o espaço aberto a vozes de praticantes e de quem está disposto a nos escrever.

Yogaforum: Como a revista conseguiu a adesão de Frawley, Kak e Feuerstein ao seu Conselho Editorial?

Nunes: O Pedro conheceu esses três autores há mais de 10 anos, em 1996, quando comecou a pesquisar sobre a história do Yoga e da Índia Antiga. Ele manteve contato ao longo de todo este tempo com os tres estudiosos. Naturalmente, eles foram convidados para integrar o Conselho Editorial quando a idéia saiu do papel. Todos eles aceitaram colaborar com prazer, respondendo nossas dúvidas sobre algumas traduções e selecionando textos para publicação.


Esta é uma publicação que merece nosso apoio. Você pode prestigiar o esforço dos “Cadernos de Yoga” fazendo sua assinatura pelo site da revista. Até o processo da assinatura é “artesanal”, mas vale a pena. Basta clicar na imagem acima.

Yogaforum: Tendo se iniciado no verão de 2004, podemos dizer que se trata de uma publicação ainda bastante “jovem” no mercado. É possível dizer que ela já alcançou sua sustentabilidade econômica, ou ainda está buscando o ponto de equilíbrio?

Nunes: Os Cadernos são sim uma publicação jovem, porém com maturidade, pelo reconhecimento que adquiriu no meio yogi. Não posso dizer que os Cadernos, enquanto empresa, seja um negócio lucrativo. Mas certamente é auto-sustentável.

As edições dos Cadernos são artesanais, feitas a poucas mãos. A tiragem ainda é pequena, em média 1.200 exemplares. A característica principal dos Cadernos hoje é o comprometimento com a qualidade e credibilidade do conteúdo, menos do que a forma ou a quantidade. Sabemos que na sociedade em que vivemos a forma conta muito. Tanto a forma da publicação (imagem, cor, apelos visuais) quanto a “boa forma” no conteúdo (trazer assuntos à boa forma e bem-estar, em detrimento da meditação, do estudo de si próprio, do sânscrito, dos mantras ou da cultura védica). Essa aboradgem superficial está fora das premissas dos Cadernos. A publicação é uma fonte de aprofundamento para o estudo e a prática. Essa característica acaba fazendo uma seleção dos nossos leitores e anunciantes.

Recebemos reclamações de que os Cadernos são uma publicação “acadêmica” demais. Então hoje o nosso desafio é conciliar a leveza da forma, com a profundidade do conteúdo, para que os Cadernos cheguem a mais mãos. Com isso, os anúncios cheguem a mais olhos. E assim tenhamos um maior equilíbrio financeiro. E todos ficam felizes, anunciantes (que divulgam seus produtos), leitores (que tem uma importante fonte de informação), e nós (que poderemos viver apenas disso).

Yogaforum: O mercado editorial brasileiro oferece poucas publicações na área do Yoga, embora haja um número crescente de praticantes e instrutores. A que você atribui essa pobreza de oferta? Seria falta de ousadia das grandes editoras?

Nunes: Não acredito que haja uma pobreza nesse campo. O crescimento de publicações se deu proporcional ao crescimento do número de praticantes. Em 2004, tínhamos apenas os Cadernos de Yoga como periódico nacional e poucos livros em português sobre Yoga, pois o Yoga começava entrar em evidência e a se popularizar. Hoje temos a Prana Yoga Journal, com uma grande tiragem e visibilidade, e algumas outras menores, umas ligadas a editoras outras a correntes de Yoga. Além do mais, houve um aumento significativo na quantidade e na qualidade de livros sobre Yoga publicados no país. São mais e mais traduções e novas publicações surgindo no mercado. As editoras estão investindo, pois sabem que este é um nicho que cresce e que é formado por uma classe média alta, potenciais consumidores. Para lhe dar uma idéia, recentemente quisemos publicar os dois novos livros de Georg Feuerstein. Poucas semanas após o lançamento desses títulos nos Estados Unidos, uma editora brasileira já havia comprado os direitos de tradução de ambos. Eu não chamaria isso falta de interesse.

Yogaforum: Vamos falar em números. Qual é a tiragem atual dos Cadernos de Yoga? Quantas páginas e quantos artigos, em média, por edição?

Nunes: Temos uma média de 12 artigos por edição, distribuídos numa média de 90 páginas. A nossa tiragem até o momento variou entre 800 e 2000 exemplares. A próxima edição terá uma tiragem de 1.200 exemplares. Os Cadernos hoje, para ir para a gráfica, precisam do apoio dos anunciantes. E o nosso trabalho, como disse, é chegar a mais mãos e olhos em todo o Brasil. O nosso país é grande e temos muitos praticantes interessados em estudar e aprofundar o conhecimento no Yoga e temos certeza de que os Cadernos são a publicação mais indicada a essas pessoas. Estamos mais presentes no sul e no sudeste do país. Começamos a fazer parcerias de divulgação no nordeste e no centro-oeste. A nossa meta é dobrar o número de assinantes e a tiragem na edição 20. E assim termos mais investimentos de anunciantes.

Yogaforum: Vocês têm recebido feedback dos leitores? Como tem sido esse tipo de contato com seu público? Houve alguma mudança significativa que tenha sido provocada por carta de leitor?

Nunes: Temos respostas muito positivas dos leitores. Estes reconhecem que os Cadernos são uma publicação com credibilidade, independência e profundidade nos assuntos que aborda. As críticas que surgiram, em determinado momento, e que mais nos fizeram refletir e transformar foi a indicação de que estávamos nos tornando “prolixos” demais, “muito acadêmicos”. A próxima edição, a 19, vem diferente, os leitores notarão. E essa mudança foi motivada por essas críticas e pelo contato que temos com leitores em cursos e eventos dos quais participamos.

Yogaforum: O tema da regulamentação do Yoga, ou o pleito da Educação Física pelo controle sobre os profissionais do Yoga, tem sido um tema solicitado pelos leitores dos Cadernos, ou o público tem seu foco apenas nas questões técnicas do Yoga?

Nunes: Não temos solicitações nesse sentido. Percebo que poucos são os instrutores preocupados com esse assunto que, aliás, é de extrema importância para todos nós. Recomendo a leitura do primeiro artigo que está na edição 01 dos Cadernos de Yoga. Lá o professor Anderson Allegro apresenta a situação e fala da importância da Aliança do Yoga. Em parceria com a Aliança do Yoga, temos o compromisso de manter os leitores a par da situação. E desde já convidamos todos os praticantes a se filiarem a esse órgão. No momento a ameaça parece estar adormecida. Mas acreditamos e defendemos que devemos nos unir em torno da Aliança para assegurarmos o nosso direito de ensinar. Caso corramos o risco, novamente, de termos a nossa liberdade de ensino cerceada será a representação coletiva que fará a diferença.

Yogaforum: Quais os próximos passos da revista? Há projetos novos em curso?

Nunes: É importante enfatizar que passamos atualmente por um processo de transição. O Rodrigo, que era o editor e administrador anterior dos Cadernos, afastou-se do projeto. Por momentos, o projeto ficou ameaçado de extinguir-se. Minha esposa Chris e eu, com o apoio de algumas pessoas que estiveram ao nosso lado, decidimos trabalhar para que isso não acontecesse e assumimos a publicação. Seria uma perda muito grande à comunidade yogi se os Cadernos acabassem.

Desde abril assumimos toda a parte administrativa dos Cadernos e a próxima edição será a primeira sob a nossa responsabilidade. Trabalhamos desde já para ampliar a distribuição dos Cadernos e, a partir da próxima edição, a qual finalizamos hoje e enviamos para a gráfica (23 de junho de 2008), dar uma nova cara a publicação. Recebemos sugestões de leitores de tornarmos a publicação mais leve à leitura. Essa é a nossa intenção, suavizar a leitura, sem perder a profundidade dos assuntos abordados. Outra idéia que temos é a publicação de edições extras temáticas. Temos um projeto embrionário em andamento, mas preferimos guardar a idéia para não estragar a surpresa.

Yogaforum: A que você atribui o prestígio que os Cadernos de Yoga alcançaram junto aos instrutores de Yoga?

Nunes: Acredito que o caráter não dogmático, independente (ideológica e politicamente), e aberto dos Cadernos de Yoga é o que os diferenciam dentro do meio yogi.