O Yogaforum foi a São Paulo conversar com Andre de Rose, um instrutor de Yoga assombrado pelo próprio sobrenome. Nascido no Rio de Janeiro, Andre, por conta de sua trajetória no Yoga, tornou-se uma referência em asanas para muitos outros instrutores no Brasil e em Portugal. Para quem não o conhece ainda, pedimos que ele respondesse a umas poucas perguntas, e o resultado está publicado abaixo.

Yogaforum: Quem é Andre de Rose, na opinião do próprio André?

Andre: Antigamente eu pensava em mim, fora do contexto do Yoga, mas atualmente quando penso na minha escolha de vida, não consigo separar quem eu sou, daquilo que eu faço, sou um Yogin. Hoje procuro me expressar de forma mais autêntica, uma busca por satyam (autenticidade). Esse estado de verdade interior é a busca maior de todo o praticante de Yoga. Hoje não persigo mais uma ideologia, pois Ideologias são utopias, como dizia o escritor Uruguaio Eduardo Galeano,e resumindo sua idéia, a utopia está no horizonte, quanto mais você caminha em sua direção, mais ela se afasta.

Yogaforum:  A próxima pergunta é inevitável, por causa de seu nome: o que você tem (ou teve) a ver com a Rede De Rose?

Andre: Como todos sabem sou o filho do Luis Sergio De Rose e inevitavelmente acabei trabalhando na Rede DeRose (que hoje em dia tem outro nome, eu acho…). Fiquei lá por uns 15 anos de 1982 quando conheci o meu pai pela primeira vez, até 1990 e mais tarde voltei a trabalhar com eles entre 1994 e 2000, época que saí definitivamente e até hoje estou sem contato direto. Só tenho alguma notícia, quando uma ou outra pessoa que assim como eu, também sai e acaba por vir me visitar para pedir alguma orientação (o que faço com carinho, sem fazer perguntas).

Yogaforum:  Qual é a tua visão do Yoga, hoje?

Andre: Hoje fazendo quase 30 anos que dou aulas, percebo com certeza que é muito diferente daquilo que eu executava quando mais jovem. Ao ficarmos mais velhos vamos amadurecendo as nossas ideias e passamos a perceber melhor as coisas corrigindo enganos. Na verdade foi uma surpresa muito boa, que depois de 18 anos defendendo um método, eu mudasse tão radicalmente meus pontos de vista. Percebi que existiam muitas informações falsas, provenientes da própria Índia, todavia a maior confusão aconteceu aqui mesmo no Brasil, onde o oportunismo comercial criou um aleijamento da prática. Tinha uma ideia de que Yoga era apenas técnica corporal, agora percebo o erro grosseiro que cometi, mas ao mesmo tempo me ajudou a montar uma prática psicológica, baseada em exercícios físicos que mais se aproxima da visão tradicional, do que da invenção moderna estabelecida há uns 200 anos, com a introdução do treinamento militar na prática do Yoga.

Uma das diversas pesquisas que me nortearam nesse sentido, foi de uma indiana que é professora de história chamada Meera Nanda, ela defende a ideia de que o Yoga praticado hoje no mundo inteiro é uma fraude, causando um imenso desconforto no meio do Yoga. Isso está produzindo um enorme rebuliço no metiê, que nesse momento, se recusa a revisar velhos paradigmas e ao invés de ajudar a trazer esse conhecimento a público, esbarra no medo e no preconceito, cravados com garras poderosas em suas cabeças, como um vasana indesejável, que é difícil de se soltar. Mas essa revisão da história indiana levantada por diversos historiadores, encabeçada principalmente pela Romila Thapar, estará batendo no calcanhar de todos em menos de 10 anos, quem não se atualizar agora, correrá o risco de parecer um fóssil em pouco tempo.

Yogaforum:  De que experiências em sua vida veio essa sua visão atual?

Andre: Uma série de coincidências aconteceu nos últimos 10 anos, que literalmente colocaram no meu colo uma grande quantidade de informações. Tudo começou com minha primeira viagem a Índia, onde confrontei o que tinha aprendido com uma outra verdade, em seguida um aluno disponibilizou seu patrimônio, para viagens, pesquisas e estudos na área de Yoga e isso possibilitou muitos contatos, principalmente na área de história, arqueologia e sânscrito. Disso resultou uma amizade com o professor Carlos Eduardo, de onde obtive grande parte do conhecimento Natha, que usei para fundamentar minhas aulas.

Yogaforum:  Você tem sido apresentado, algumas vezes como um instrutor fortemente ligado à prática dos ásanas. Por quê?

Andre: É verdade, isso ocorre com frequência, mas julgo que isso foi devido a um fato curioso, que mudou minha decisão de abandonar a prática. Na década de 80, eu tinha recém-iniciado a pratica do Yoga e estava fazendo por mera curiosidade, vou confessar que não estava lá muito entusiasmado, mas quando minha professora virou para mim depois de algum tempo que eu treinava e disse: “André porque você não faz aeróbica, ciclismo ou cooper, você não está vendo que não nasceu para fazer Yoga”? Isso me indignou tanto, que ao invés de desistir, imediatamente comecei a fazer sozinho, com muito mais dedicação, sentava diante dos livros e procurava copiar a posição da forma mais fiel que eu conseguia, aos poucos fui desenvolvendo formas muito pessoais de fazer as posições. E enquanto a maior parte das pessoas, achavam que homens não tinham condições de fazer determinados exercícios, pois achavam que seriam apenas possíveis para as mulheres, e por esse motivo, acabavam não incentivando isso em suas aulas, eu (por estar fazendo sozinho), ignorava completamente esses paradigmas. Segui treinando todos os dias e acabei por desenvolver o que hoje é a base do meu método.

Naquela época quando eu ainda era adolescente lembro que treinava até os membros adormecerem, tanto fiz, que certa vez eu estava na sala de aula praticando, quando de repente, senti um cheiro de algo queimando, abri imediatamente os olhos e confirmar que a sala estava tomada pela fumaça. Contudo, quando fui me mexer para sair dali, percebi que meus braços e pernas estavam completamente adormecidos por causa da posição (baddha upavista konásana ou uttana kurmasana), eu estava treinando permanência por tanto tempo que meus braços e uma parte das pernas tinham adormecido. Tomado pelo pavor, tentei sair da posição sem sucesso umas duas vezes. Quando finalmente consegui me mexer percebi que uma brasa do incenso havia caído no chão da sala, que era coberto com jeans sobre espuma, e ele estava queimando. Ridiculamente com os braços ainda adormecidos, eu o Yogi incendiário, tentava apagar as chamas numa cena patética digna de comédia pastelão, acabei por conseguir evitar algo pior. E aprendi a não exagerar nas permanências.

Algum tempo depois, fui para um congresso de Yoga no SESC Pompéia, lá me chamaram para fazer uma tímida exibição. Pois bem, para minha surpresa, a apresentação foi um sucesso, muita gente perguntava quem era o rapaz que tinha feito a demonstração. Comecei a ser solicitado para dar aulas e cursos por diversos lugares, viajei para fora do país, e todos consideravam minha forma de executar, um tanto diferente. Essa solicitação me fez procurar mais informações sobre o assunto, e fui fazer cursos para me aperfeiçoar. Contudo aquela forma de me exercitar continuava sendo diferente dos demais, pois minha base tinha sido erguida sobre a grande dificuldade que eu tinha em fazer as posições. Esse improviso, e posteriormente as técnicas que treinei de outras escolas, proporcionaram algo novo, que as pessoas estavam gostando muito.

Outro fator que possivelmente contribuiu para me tornar notório em posições de Yoga, deve-se ao fato de que durante mais de uma década, pesquisei e acumulei informações sobre as técnicas de várias escolas, ampliando um trabalho que já tinha sido feito pelo Iyengar (200 posições), Dharma Mitra (908 posições) e posteriormente pelo Luis De Rose (840 posições). Essa coletânea que eu fiz, tinha 2111 posições e foi publicado como parte do livro “Practica de Yoga Avanzado” na Espanha em 1997, onde constam os créditos da elaboração a minha pessoa. Hoje estou revendo todo o trabalho e já alcanço a soma de quase 2500 posições baseado apenas em pesquisa, sem invencionices.

Isso tudo acabou me projetando muito, mas (não vejam isso como uma reclamação), sou muito grato por tudo o que fiz, tenho que reconhecer que fiquei muito bom nas posições do Yoga moderno. Contudo queria entender porque, mesmo eu tendo lançado um livro com mais de cento e vinte exercícios respiratórios, outro livro sobre yoganidrá, um manual de shat karma, um estudo sobre mudrás na dança e no Yoga e nenhuma publicação sobre técnicas físicas, ainda assim as pessoas me vinculam apenas ao treinamento corporal.

Yogaforum:  Você nasceu no Rio de Janeiro, onde vive o professor Hermógenes. Você teve contato com ele, em sua formação?

Andre: Sim isso é verdade, contudo nunca tive aulas com ele, o que é uma pena. Participei de palestras e encontros em diversas ocasiões. Tivemos algumas conversas onde simpatizamos um com o outro e até enviei a ele os originais do Livro de Ouro do Yoga, uma ideia que reunia a opinião de vários autores incluindo a mim mesmo e que fui o coordenador. Ele gostou tanto que acabou prefaciando a obra, o que me encheu de felicidade. Hoje o método dele estará presente no nosso curso de Aperfeiçoamento Técnico, aqui em São Paulo, no Espaço Mahal.

Yogaforum:  Quais são os teus objetivos neste momento?

Andre: Entre outras coisas, uma delas é divulgar as minhas descobertas e dividi-las com as outras pessoas, para criar um debate franco sobre os rumos que a prática de Yoga vem tomando. Outro é difundir uma prática que eu desenvolvi, baseada na tradição Natha que é chamada gama agama parikramah, procurando conciliar o antigo com o moderno, onde reúno as posições físicas com os exercícios de meditação.