mais um sapo

Mais uma vez os instrutores de yoga são assombrados com a perspectiva de uma regulamentação profissional. Um novo projeto de lei focado nos mercados de trabalho relacionados ao yoga começou a tramitar na Câmara dos Deputados, em Brasília. O autor da propositura, desta vez, é o deputado federal Carlos Bezerra (PMDB, MT).

O projeto de lei foi apresentado ao Plenário da Câmara no dia 3 de fevereiro deste ano e recebeu o número 4.282/2016. A mesa diretora despachou o projeto, no dia 12 de fevereiro, para tramitação ordinária (sem urgência) às Comissões de Trabalho, de Administração e Serviço Público (CTASP) e Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJC). A CTASP recebeu o projeto em sua reunião ordinária de 17 de fevereiro, e ali o projeto permanece até o momento, aguardando a redação do parecer com a manifestação da comissão.

Mais um projeto original e inovador que se propõe a regulamentar a prática profissional do yoga? Infelizmente não. O texto do projeto apresentado por Carlos Bezerra é idêntico ao do PL 3.204/2012, de autoria do deputado federal Eliseu Padilha (PMDB, RS), que foi arquivado pela Câmara dos Deputados em setembro de 2015 com um parecer (pela rejeição) da relatora designada pela CTASP, Dep. Andreia Zito (PSDB-RJ). Idêntico também ao PL 2.548/2007 (de 5/12/2007), do próprio deputado Padilha, que havia sido arquivado anteriormente em razão do final da legislatura anterior.

O projeto que tramita hoje é, portanto, uma cópia idêntica de outro que já foi arquivado anteriormente, Então cabe perguntar que razão leva um deputado a reapresentar um projeto de lei que já tramitou e que já se complicou com um parecer pela rejeição? O assunto do yoga não tem relevância política, e não está na pauta dos debates mais importantes de Brasília. Só podemos imaginar, então, que há outros interesses que se ocultam por trás desses deputados e que desejam transformar em lei os assuntos pertinentes a seus interesses privados. Que interesses são esses, talvez nem mesmo o deputado proponente do PL saiba precisamente quais são.

Podemos, no entanto, perceber um padrão nas iniciativas de regulamentação, que aparece desde a proposição mais antiga (o PL 708/1979 do deputado Eloy Lenzi): todas abrem a possibilidade da criação de um mecanismo de controle do mercado através de entidades de classe. Esse mesmo objetivo transpareceu no projeto de lei 4.689/2001, do deputado Aldo Rebelo (PCdoB, SP), arquivado pelo Senado Federal em 8/2/2007. O projeto de Rebelo também foi sucedido por um projeto de redação idêntica, o PL 1.773/2007 do deputado Edson Aparecido (PSDB, SP) cuja tramitação teve vida curta, tendo sido arquivado em 25/03/2008. Os dois projetos mais recentes falam em criação de conselho federal e conselhos estaduais de “Yôga” (assim mesmo, acentuados) e tanto na sua redação quanto na justificação que acompanha o projeto fica evidente que eram projetos direcionados para os interesses da rede de escolas comandadas pelo instrutor Luis Sérgio DeRose.

O artigo terceiro do novo projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados informa que “compete privativamente aos profissionais de Ioga” uma série de atividades descritas nos seus incisos. Acontece que toda “competência privativa” implica em necessidade de fiscalização, e o agente fiscalizador principal de uma categoria profissional, no modelo legislativo do Brasil é o conselho federal dessa profissão (secundado pelos conselhos regionais) – uma autarquia com poder de fiscalização dos profissionais daquela categoria.

Dizer que o conselho terá uma composição heterogênea, de modo a reconhecer a validade das inúmeras “modalidades” de yoga que se estabeleceram no mercado, sem manifestar preferências nem promover perseguição a grupos que discordem da orientação adotada pelos conselheiros, é dizer uma mentira. A disputa pelas posições de conselheiros envolve a capacidade de arregimentar votos, o que faz do conselho uma instância do poder político para seus componentes. Enfim, esses órgãos de classe (inclua-se aí os sindicatos) são tudo o que o universo do yoga não precisa. Afinal de contas quem gostaria de ver os professores de yoga reféns de uma fiscalização comandada por interesses privados de linhas de pensamento que rivalizam com a sua?

Como dissemos, essas tentativas de regulamentação seguem um padrão – que é o da criação de órgãos fiscalizadores que dão poder mercadológico a quem os controla. Mas todas elas também têm um destino padrão: o arquivamento. Mas esse destino não é determinado pelo modo como o projeto de lei tramita na casa legislativa. É determinado pela mobilização dos profissionais que se sentem ameaçados pela (aparentemente bem intencionada) proposição do deputado. Foram mobilizações desse tipo que derrubaram cada uma dessas tentativas espúrias, e mais uma vez somos levados à necessidade de refletir sobre o teor de mais esse projeto e levar nossa opinião ao deputado proponente.

Você se sente representado pela proposta desse deputado? Apoie o projeto. Você se sente ameaçado por mais essa assombração que paira sobre nosso mercado de trabalho? Ponha a boca no megafone e diga ao deputado que não concorda com a ideia que ele (junto com seus antecessores históricos) abraçou.